segunda-feira, 26 de março de 2012

Do Agnosticismo Pró-Ateísmo Agressivo
(Porque sou mais Dawkins ou Hitchens)

A propósito deste vídeo sugerido por um grande amigo, com quem já tive determinadas trocas de ideias acerca do tema, surge-me dizer algumas coisas.
A ideia de Botton é boa. Mais do que boa, assenta numa lógica de concórdia à qual não posso deixar de ser sensível, porque, de facto, há pontos de vista que assentam perfeitamente em parte da minha visão dessas realidades. A ideia dos cântigos de Natal e fenómenos que tais, para um agnóstico empedernido como eu, merece debate interno. E apesar de ser um duvidador metódico com um desgosto profundo pelas dogmáticas religiosas, existem determinados valores, talvez os puramente gregários, que nãome são estranhos. E sim, tenho uma visão ou experiência de transcendência quando olho para coisas inacreditáveis que a natureza faz, como o ornitorrinco, o diabo marinho ou os pinguins da Antártida, e, claro está, na capacidade que as pessoas têm de gostar umas das outras e o desejo materializável de criação.
Mas então porque é que sou mais chegado à noção trauliteira do agnosticismo/ateísmo? Por razões que em nada colocam grande parte das palavras de Botton em causa, mas que nalguns aspectos são divergente.

Primeiro, porque as próprias religiões organizadas são tudo menos gregárias. São clubes, com regras dogmáticas muito claras e que dispensam paternalismo e desdém por divergências claras com as suas interpretações metaforico-dogmáticas. Desde a orientação sexual à aceitação de credos e formatos alheios de vivência transcedental, a verdade é que as religiões maioritárias são, em tudo, sectárias. E os desgraçados que tentam de alguma forma um ecumenismo mais abrangente são barrados pela ala dura, por exemplo, do Vaticano ou de um Islão mais musculado, e infelizmente, a regressar em força.
No fundo, a religião é a base para estas deformações dogmáticas, e as suas, em meu ver, terríveis consequencias, e como tal, como Hitchens e Dawkins, se juntarmos isto a uma denegação teimosa da necessidade de uma realidade factual, o caldinho está todo entornado. A religião surge-me como uma espécie de exteriorização daquilo que deverá partir como impulso interno de valores humanos, gregários, e sim, até morais, embora este conceito deva ser manejado com o maior cuidado possível. É terreno fluido aquele que determina como e a quem devemos amar, e a religião nisso é magistral na dogmática sectária, seja pela misoginia milenar, pela homofobia, e depois pela risível tolerância da poligamia mormon, por exemplo.

Segundo, porque trazendo o discurso humanista mas racional e esclarecido para o debate surge apenas uma coisa possível - a pergunta. Como será, será que há algo, etc, etc, como produto de um juízo racional que, nem por isso deixar de ser humano ou sensível. E a dogmática dominante impede esse discurso, essa abertura a perguntas respondidas apenas com propostas de resposta, e não com cartilhas de repetição, como se a verdade fosse possível, e ainda por cima, incutida à marretada.

E terceiro, porque Botton fala na única coisa com a qual discordo frontalmente, e chega a ser-me ofensiva - o agnosticismo e o ateísmo não são religiões, nem formatos destas. É uma atitude gnoseológica, de dúvida metódica, de respeito e humildade pela natureza finita da nossa capacidade de conhecer, e que, no meu ramo, enfatiza as capacidades humanas para sentir, desejar, amar e sobretudo, criar. Interno, quase inatista, se bem que sujeito a processo educacional, claro, e não oriundo de dogmáticas que podem ser entendidas como instruções a seguir, e não vontades internas que se exteriorizam por força de um sistema de valores forte o suficiente para gerar uma conduta.

No fundo, não coloco em causa muito daquilo que ele diz, especialmente na ideia de que as posições se podem concertar, que as pontes são possíveis, e atenção, eu até acho muita piada a liturgia e mitos religiosos, porque na maior parte das vezes são histórias excelentes. Mas tenho muito pouco respeito por organizações baseadas em lógicas paternalistas, que se consideram mais próximas da verdade que as bruxas wiccan ou um dos meus "idolos" - Alan Moore - que adora a cobra Glychon e se apresenta como "mago". Porque é a subversão do raciocínio inclusivo que a religião deveria ter, mas cuja dogmática impede por definição, ao classificar de formas muito estreitas, o maniqueismo próprio de visão de pouco mundo.

Eu não sou parte do Ateísmo 2.0.
Sou um simples agnóstico que gosta de ouvir histórias, que se perguntar milhares de vezes acerca da natureza das coisas, que até acha que pode haver uma transcendência, mas que crê piamente que a maior das magias está na capacidade intrinseca de sermos bons, capazes de criar, e sensíveis a uma experiência talvez até espiritual, mas que, em meu ver, jamais poderá por o pensamento humano de lado.

Botton era o tipo que propôs construir um templo do ateísmo em plena Londres, o que por tudo o que disse acima, é uma subversão do meu entendimento. Mas, isso não quer dizer que não ache estas ideias boas, e que até não incorpore muitas delas no meu código de comportamento.
Simplesmente há algo nas histórias fantasiosas que me incomoda quando as querem impor como verdade e não como a única coisa que são - uma hipótese. Quanto muito, uma boa e criativa série de perguntas.

Mas gosto das ideias de Botton, e até concordo com ele mais do que pode aparentar.




quarta-feira, 7 de março de 2012

A Poesia do Entomólogo (Ou Botânico?)
"Point is, what's so wonderful is that every one of these flowers has a specific relationship with the insect that pollinates it. There's a certain orchid look exactly like a certain insect so the insect is drawn to this flower, its double, its soul mate, and wants nothing more than to make love to it. And after the insect flies off, spots another soul-mate flower and makes love to it, thus pollinating it. And neither the flower nor the insect will ever understand the significance of their lovemaking. I mean, how could they know that because of their little dance the world lives? But it does. By simply doing what they're designed to do, something large and magnificent happens. In this sense they show us how to live - how the only barometer you have is your heart. How, when you spot your flower, you can't let anything get in your way."
Charlie Kauffman "Adaptation"